segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Provocação

   Atrasada, entrei no primeiro tram que apareceu na minha frente para, um minuto depois que a porta se fechou, reparar que eu tinha subido no que daria a maior volta possível. Mas, uma vez que o caminho se distanciava muito do convencional já a partir da próxima parada, decidi ficar, colocar a pressa de lado e degustar a nova paisagem que me estava sendo proporcionada. O curioso foi que não a paisagem de fora, mas, sim, a de dentro que me cativou. Digo, sem o menor receio da repreensão do público, que eu, mulher casada, gastei todos os 12 minutos do percurso paquerando no tram!
    De início me causou certa repulsa aquele dedo enfiado no nariz, mas o sorriso de lado e o olhar insistente sobre mim conseguiram me capturar e, o que era de início um interesse puramente escatológico, acabou virando uma paixão a segunda vista.  
    Nos primeiros minutos joguei o típico jogo do faz-de-conta-que-não-estou-olhando, mas logo eu já não conseguia disfarçar... Que olhos! Que charme! Que presença! Reparei que ele continuava me mirando por trás de uma mecha de cabelo que caia sobre a sua testa. Sustentei meus olhos na sua direção até ser tomada pela timidez. Olhei para minhas mãos... O que ele acharia se as visse tão maltratadas assim? O sorriso maroto permaneceu ali na minha cola. Com as pupilas dilatadas, tentei novamente encara-lo,  como faria uma mulher moderna.  E com o passar das tentativas fui ficando mais auto-confiante e a relação entre nós cada vez mais séria. Em determinado momento, pensei até em mandar um beijo discreto... mas avaliei que poderia ser um movimento ousado de mais para os padrões daqui. 
   Mas afinal, o que estava acontecendo comigo? Consegui ver tão profundamente seus olhos que me senti provocada por dentro e o pensamento sobre aquela possibilidade me estremeceu e, subitamente,  escapou de mim pelos lábios.
    Não sei ao certo se interceptando o namoro ou simplesmente pela chegada ao destino, sua mãe o pegou no colo e apertou o botão para descer no próximo ponto. Sentindo meu coração mais aberto, me despedi com o olhar, mas não sem antes reconhecer a beleza que há nos caminhos não planejados.

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